Estudo multicêntrico integra vigilância entomológica e dados climáticos em três locais da Amazônia para orientar estratégias de controle da malária.
Principal objetivo desta fase é identificar, com precisão, quais espécies de mosquito picam, em que horários e em quais ambientes
A Fiocruz Rondônia, em parceria com uma rede de instituições nacionais e internacionais, deu início à Fase 3 do Projeto Pró-Amazônia Malária. Esta etapa é dedicada ao monitoramento sistemático de mosquitos do gênero Anopheles na Bacia Leiteira, zona rural de Porto Velho que concentra elevada incidência local de malária. O estudo é coordenado pelos pesquisadores Jansen Fernandes Medeiros e Maísa Araújo e se estende também à Agrovila (Tefé/AM) e a uma área indígena em Cruzeiro do Sul (AC). O projeto integra dados entomológicos e climáticos para embasar intervenções futuras.
Importância do monitoramento de vetores
O principal objetivo desta fase é identificar, com precisão, quais espécies de mosquito picam, em que horários e em quais ambientes (dentro ou fora das casas), além de aspectos do comportamento da população local. “Ao entender se o mosquito pica predominantemente dentro das casas e em quais faixas de horário, podemos definir melhor as brechas de proteção e direcionar as medidas de controle”, explica Maísa Araújo, coordenadora da pesquisa em Rondônia.
Métodos e dados integrados
O protocolo de campo combina técnicas consagradas, como a técnica de atração por humano protegido (TAHP), coletas de repouso intradomiciliar com pulverização de piretro (knock-down) e o registro padronizado de hábitos da população. No laboratório, os mosquitos passam por identificação morfológica, triagem por espécie, avaliação de paridade e estimativas da Taxa de Inoculação Entomológica (EIR, Entomological Inoculation Rate), indicador crucial do risco de transmissão. O principal vetor de interesse na região é Anopheles darlingi. Para correlacionar o ambiente com a abundância dos mosquitos, o projeto utiliza miniestações meteorológicas, que registram, em tempo quase real, temperatura, pluviosidade, umidade e velocidade do vento.
Trabalho minucioso de coleta de mosquitos é parte fundamental do estudo
Edson Neves da Cruz, que é agente de combate à endemias do Laboratório de Entomologia (DCZ – Semusa), explica que a triagem é meticulosa, “separamos as espécies, identificamos as de relevância epidemiológica e estimamos infectividade, gerando dados sólidos para a vigilância em saúde local.”
O biólogo Romário Gabriel dos Reis Portes, que atua como técnico de atividades de campo esclarece como se dão a participação da equipe e da comunidade neste momento do estudo. Segundo ele, “nossa rotina vai da captura à análise laboratorial, quando checamos espécie, alimentação sanguínea e possível infecção. É um trabalho minucioso — e nem todo mosquito transmite malária. Com autorização do morador, forramos um cômodo com lençóis brancos, aplicamos o produto e coletamos os insetos para verificar se o Anopheles pernoita dentro da casa.”
A moradora Elaine Botelho de Oliveira conta que quase todo mundo já teve malária na região, “a presença dos pesquisadores e a possibilidade de fazer os testes perto de casa ajudam muito”, conclui.
“Pela vivência, os horários mais críticos são entre 17h e 19h e das 5h às 7h. Hoje, nos prevenimos com casa telada, repelente e cuidado redobrado nesses horários”, diz o morador Sergio Grimualdo.
Moradores relatam histórico de convivência com a malária na região
Alinhamento com as diretrizes nacionais
A malária, causada por parasitos do gênero Plasmodium, tem a maioria dos casos brasileiros concentrada na Amazônia Legal. O Projeto Pró-Amazônia Malária está alinhado com as diretrizes do Plano Nacional de Controle da Malária (PNCM) do Ministério da Saúde, que visa a redução sustentada e a eliminação da transmissão.
Próximos passos
Após 12 meses de monitoramento entomológico, terá início a Fase 4, com ações educativas na comunidade e a implementação das intervenções: Área 1 — distribuição universal de MILDs (mosquiteiros impregnados de longa duração); Área 2 — MILDs + TDRs (testes de diagnóstico rápido) com tratamento imediato dos casos identificados. A Fase 3 fornecerá a base de dados essencial para o sucesso dessas ações, acompanhando o cenário antes, durante e após a implementação, inclusive a percepção da comunidade, adesão e mudanças na EIR.
Coordenação e agências de fomento
Projeto: Pró-Amazônia Malária – Fase 3 (vigilância entomológica)
Coordenação geral: Jansen Fernandes Medeiros (Fiocruz Rondônia)
Coordenação em RO: Maísa Araújo (Fiocruz Rondônia)
Locais: Bacia Leiteira (Porto Velho/RO); Agrovila (Tefé/AM); área indígena em Cruzeiro do Sul (AC)
Parcerias: SEMUSA/DCZ; Agevisa/RO; CEPEM; ILMD/Fiocruz Amazônia; USP; MEI/UCSF; PNCM/MS
Fomento: FAPERO e CNPq
Texto: Raissa Dourado com revisão de José Gadelha
Fotos: Raissa Dourado e Edinaldo Reis